PÁGINAS

domingo, 24 de julho de 2011

CASA GRANDE E SENZALA – GILBERTO FREYRE, 1933

No prefácio da obra, Darcy Ribeiro considera que Gilberto Freyre em CG&S nos ensinou a nos reconciliarmos com nossa ancestralidade lusitana e negra, de que todos nós nos vexávamos um pouco. Trata-se, segundo ele, de uma “interpretação arejada e bela da vida colonial brasileira”, que “ajudou o Brasil a tomar consciência das suas qualidades, principalmente das bizarras”; e ajudou os brasileiros a “aceitarem-se tal qual são”.

No inventário amiúde que faz Gilberto Freire da vida colonial brasileira, do sistema patriarcal e escravocrata, o autor dedica atenção às cantigas, citando inclusive trechos de algumas, mostrando a importância delas como instrumento multiuso, como para direcionar o comportamento das pessoas. Ao mesmo tempo em que as cantigas serviam para ninar a criança, alegrar o ambiente, animar as festas, cultos religiosas e as diversas atividades do trabalho, funcionavam também como reforço ideológico para afirmação de poder, para catequizar, converter e cultuar a fé católica.

A cantoria era utilizada ainda para invocar a intervenção dos santos para os casamentos e como apelo de cunho erótico para estimular o romance, a sexualidade ou a fertilidade. As cantigas também eram usadas para disciplinar, através do medo, criança má educada, ou para manutenção do bom comportamento aos padrões de criação das crianças da época. Nesse caso, as cantigas abordavam temas fantásticos, de mal assombro. Uma outra utilidade da cantiga era para reforçar as brincadeiras violentas e sádicas dos meninos.

Foi o negro que animou a vida doméstica do brasileiro da sua mais pura alegria. (O português era melancólico, sorumbático, tristonho enquanto que o caboclo quase um doente na sua tristeza. A risada do negro é que quebrou essa apagada e vil tristeza, alegrando os São Joões de engenho, animou os bumba-meu-boi, cavalos marinhos, canaviais, festas de Reis e o Carnaval.

Nos engenhos, tanto nas plantações como dentro de casa, nos tanques de bater roupa, nas cozinhas, lavando roupa, enxugando prato, fazendo doce, pilando café, nas cidades, carregando sacas de açúcar, pianos, sofás de jacarandá de ioiôs brancos – os negros trabalhavam sempre cantando seus cantos de trabalho, os de xangô, os de festa, os de ninar menino pequeno – encheram de alegria africana a vida brasileira.

Gilberto Freyre deixou para fechar o seu livro com essa reflexão: “Mas não foi toda de alegria a vida dos negros escravos de ioiôs e das iaiás brancas. Houve os que se suicidaram comendo terra, enforcando-se, envenenando-se com ervas e postagens dos mandingueiros. O banzo deu cabo de muitos. O banzo – saudade da África. Houve os que de tão banzeiros ficaram lesos, idiotas. Não morreram: ficaram penando. E, sem achar gosto na vida normal, entregando-se aos excessos, abusando da aguardente, da maconha, masturbando-se”.

Este texto foi uma cortesia de Bartolomeu, meu colega da pôs graduação em História e Literatura. Bartolomeu obrigado pela contribuição.

(Lucimar Simon)

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